A Troca (Changeling 2008)
Dirigido por Clint Eastwood
Escrito por J. Michael Straczynski
Baseado em fatos reais
Um filme espetacular com uma heroína trágica que não deve nada ao feminismo em uma
história que mistura drama, corrupção e horror.
O Coração de mãe
A atriz Angelina Jolie é mundialmente conhecida por sua beleza e seus filmes de ação. E já
afirmo isso para explicar o quanto esse filme é diferente de tudo o que ela já fez. Em A Troca,
Angelina Jolie está em um dos melhores papeis de toda a sua carreira ao interpretar uma
pessoa real, Christine Collins, uma pessoa comum com um porte físico muito magro e frágil. O
filme chega até a mostrar ângulos de câmera que denunciam a sua verdadeira altura perto dos
outros atores. Tudo para mostrar como ela é frágil no filme.
Christine Collins e seu filho Walter vivem em Los Angeles de 1928. Ela é uma mãe solteira que
trabalha na rede de telefonista encaminhando ligações para os mais diferentes números. É
uma guerreira. E apesar das dificuldades, ela tem uma lição de vida muito boa para seu filho
Walter: Nunca comece uma briga, mas se começarem, vá até o fim!
O filme explica as datas, mas eu vou explicar também o tempo decorrido depois de 10 de
Março de 1928. Neste dia, Christine é chamada para trabalhar na sua folga e deixa seu filho
Walter sozinho em casa. Ao voltar para casa tarde do serviço, Christine percebe a falta de
Walter. Vale explicar que tudo na casa parecia bem. Tudo estava perfeitamente arrumado e em
ordem, mas Walter não estava em casa. Christine procurou pela vizinhança e amigos, mas
nada de Walter. Chegando ao ponto de telefonar para a policia.
A denuncia contra a corrupção da policia
Reverendo Gustav Briegleb, vivido pelo grande John Malkovich, é apresentado no filme
denunciando casos de corrupção tanto na politica quanto na policia de Los Angeles de 1920.
Possuindo uma rádio onde exerce seu direito. Foi uma pessoa real de muita importância na
época.
Mas só no decorrer do filme vamos ver até onde vai a corrupção da policia de Los Angeles na
década de 1920.
O Encontro
O que o filme não conta é que Christine Collins montou um grupo comunitário para falar sobre
o desaparecimento de seu filho e isso levou o caso para a mídia. Era o ano de 1928 e
desaparecimentos de crianças eram algo completamente incomuns.
Christine Collins fica completamente sozinha com poucas noticias da investigação de seu filho
por meses. Tudo isso até 22 de Julho de 1928. Christine é visitada em seu serviço por policiais,
entre eles o Capitão J.J. Jones, interpretado pelo ator Jeffrey Donovan, que lhe deu a noticia.
Seu filho Walter foi encontrado e está bem. A cena é um primor pelos detalhes mais simples
como o detalhe de uma mãe que precisa se segurar para não cair perante a visão dos policiais.
A construção de uma alegria genuína quando se fala a uma mãe que encontrou o filho dela. A
alegria das colegas de trabalho de Christine. Quem já trabalhou em resgate de crianças sabe a
alegria.
Foram mais de 4 meses de pesadelo. Dias depois, completando 5 meses, terminaria tudo.
Christine Collins foi levada para a estação de trem, estava cercada de repórteres e os policiais
iriam devolver seu filho salvo. A emoção foi tanta que Christine simplesmente saiu correndo
para as portas quando viu o trem chegando. Encontrando assim seu filho...
A troca
Só de olhar, Christine reconhece que o menino que chegou não é seu filho! Houve uma troca!
Uma mãe sabe quando alguém tenta se passar por seu filho. O Capitão J.J. Jones explicava que
ela ainda estava em estado de choque, em estado de negação. E piorava tudo quando o
menino se apresentava como seu filho falando o seu nome e seu endereço. Ele a abraçou e a
chamou de mãe. Mas Christine falava desde o começo que o menino não era o filho dela.
Existiu realmente um choque e Christine finalmente reconheceu que talvez ela não esteja
pensando claramente. Aceitando levar o menino pra casa e tirar uma foto para a imprensa.
Em casa, já na primeira noite, Christine apenas confirma o que já sabia. O menino não era seu
filho!
Ele era 5 centímetros mais baixo e ainda por cima circuncidado.
O pedido de uma mãe
O filme retrata bem que Christine Collins reconheceu que o menino que levou para casa não
era o seu filho desde o começo. Assim com o fato de que ela foi falar mais uma vez com o
Capitão J.J. Jones para que não encerre as investigações sobre seu filho.
Contudo, o Capitão J.J. Jones não reconhece nenhum erro e insiste que Christine Collins está
de fato histérica. Christine Collins pede, implora para que não abandonem o caso de seu filho.
Mas que precisam entender que o menino que entregaram não é o filho dela.
No entanto, o Capitão J.J. Jones insiste que o caso está fechado. Algo que deixa a mãe
desesperada.
Um milagre de fé
O Reverendo Gustav Briegleb tem um programa de rádio onde faz denuncias constantes da
corrupção no governo e na Policia de Los Angeles. E está disposto a ajudar Christine Collins.
Com a ajuda do Reverendo Briegleb, o caso de Christine Collins pode ir muito mais do que a
rádio comunitária. Desta vez tendo toda a ajuda possível.
O filme chega a mostrar uma montagem rápida do Reverendo Briegleb explicando a corrupção
em Los Angeles. Onde só policiais violentos fazem parte de seu esquadrão para eliminar os
bandidos pé de chinelo e garantir o monopólio da violência.
Buscando provas
Christine Collins decide então buscar por provas, já que o moleque em sua casa insiste em
querer se passar por seu filho. Importante lembrar que mesmo que exista uma cena em que
Christine Collins grita com o menino perguntando quem ele é, nem no filme e nem na vida real
ela chegou a agredir o menino.
Christine Collins foi muito mais esperta, buscou a ajuda do dentista de seu filho que confirmou
pela arcada dentária que não era a mesma criança e confirmou com a professora que se
tratava de um impostor.
De fato, a cena da professora é de uma simplicidade tamanha. Ela não reconheceu o menino e
ainda mandou ele se sentar em seu lugar na sala, ao qual o impostor passou por burro ao não
saber.
Com estas provas em mãos, Christine Collins chamou a imprensa e denunciou o caso
publicamente!
Código 12
Com a denuncia contra a corrupção da policia, entra em cena o fator que foi uma vergonha
para a policia na época. O Código 12 era usado para prender pessoas em sanatórios sem
nenhum tipo de mandato.
O próprio Capitão J.J. Jones chamou Christine Collins para discutir sobre as denuncias e
acionou o código 12 para prender ela. Christine Collins foi então levada para um manicômio
onde seria internada sem nenhuma acusação.
Foi um verdadeiro pesadelo, Christine Collins recebeu um banho gelado de mangueira de
bombeiro completamente humilhante. Uma enfermeira fez um procedimento invasivo em sua
vagina só para tentar diagnosticar sífilis ou outras doenças. Christine Collins foi jogada em uma
cela com outra mulher, doente mental de verdade.
O responsável pelo manicômio chamava Christine todos os dias para tentar fazer ela assinar
um documento afirmando que ela estava louca e que o menino em sua casa era seu filho.
O Galinheiro de Wineville
O Detetive Lester Ybarra, vivido pelo ator Michael Kelly, faz a investigação de um jovem que
vivia ilegalmente nos Estados Unidos. Os pais canadenses denunciaram que o filho Sanford
Wesley Clark, aqui vivido pelo ator novato Eddie Alderson, estaria vivendo clandestinamente
em Wineville.
Aqui, vale o detalhe que a cena transpira por suspense sem usar clichês de filmes de terror.
Mas existe sim suspense genuíno no Detetive investigando a fazendo pois, no caminho, ele se
deparou com um homem estranho que escondia uma escopeta e tinha claras intenções de
atirar no Detetive caso ele fizesse muitas perguntas. O Diretor mostra que a ideia de perigo
real transforma qualquer cenário em filme de terror sem usar nenhum clichê.
O menino Sanford Wesley é recuperado e levado para a delegacia. E apavorado, faz o seu
relato:
O menino Sanford Wesley vivia na casa dos tios onde era abusado pelo primo e foi forçado a
sequestrar, abusar e matar crianças. O método era extremamente cruel. Sanford Wesley
entrava no carro com seu primo Gordon Stewart Northcott, vivido pelo ator Shakesperiano
Jason Butler Harner, os dois viajavam de carro por horas até encontrar algum menino sozinho
na rua.
Gordon Stewart Northcott então avisava ao menino sozinho que seus pais sofreram um
acidente e que ele deveria buscar o menino para levar ele para um hospital. Os meninos,
vitimas, desconfiavam a principio, mas como Sanford também era um menino sentado no
banco do carro, então entravam no carro.
Os meninos eram aprisionados no Galinheiro de Wineville. Onde ficaria sofrendo abusos por
dias antes de serem brutalmente assassinados. O próprio Sanford confessa em lágrimas que
também era obrigado a matar os meninos ou ele seria o próximo.
Quando o Detetive mostra então um punhado de fotos de meninos desaparecidos nos últimos
meses, Sanford reconhece diversos meninos incluindo Walter Collins, filho de Christine Collins.
Aqui, a direção do filme acertou em cheio ao evitar o tom de filme de terror, mesmo
abordando os eventos de um serial killer. O diretor, Clint Eastwood, poderia facilmente usar a
história real para fazer um filme de terror mostrando apenas os eventos terríveis do Galinheiro
de Wineville. Cuja história é real e facilmente colocaria o filme em um patamar de filme tão
assustador quanto O Exorcista. Mas Clint Eastwood preferiu fazer um filme mostrando o lado
humano das pessoas que sofreram com os eventos.
O filme chega a recriar o momento onde os policiais pediram para Sanford desencavar onde os
meninos estavam enterrados para confirmar a história. Apenas para que os policiais
descobrissem horrorizados que era tudo verdade!
O Fim da loucura
Christine Collins ainda estava no manicômio quando o Reverendo Gustav Briegleb e seus
seguidores da igreja começaram a procurar por ela.
No manicômio, Christine Collins conhece a personagem fictícia Carol, que na verdade são
varias mulheres de verdade que a ajudaram. Carol explica que o famoso código 12 já era usado
há anos pela policia para se livrar de pessoas que denunciavam a corrupção. Era usado para
simplesmente jogar as pessoas em manicômios e desacreditar todas as suas histórias.
Em um momento, Christine Collins seria forçada a tomar medicamentos contra a sua vontade.
Ela foi protegida por Carol, que chegou a aceitar ser sedada, torturada e jogada na solitária.
Quando Christine perguntou o porque dela aceitar fazer aquilo, Carol explica que nunca teve a
chance de lutar pelo próprio bebe que perdeu. Porém, Christine ainda lutava pelo filho dela. E
isso a inspirava.
Ao final de 10 dias, tentaram de toda forma fazer Christine Collins assinar um documento
afirmando que o menino que a policia entregou era mesmo o filho dela. Até que o Reverendo
Briegleb encontrou o manicómio e obrigou os médicos a entregar Christine.
Quando finalmente soltaram Christine Collins pela porta de trás, seu pesadelo se tornou
completamente intolerável quando viu os jornais anunciando que seu filho estava morto.
Christine Collins acordava de um pesadelo para se descobrir em outro.
Caçada a Gordon Stewart Northcott
O filme não mostrou, mas os pais de Gordon Stewart Northcott, Cyrus George Northcott e
Sarah Louise Northcott também estiveram envolvidos nos assassinatos do filho. Sendo a dupla
de sádicos que abusaram, torturaram e transformaram Gordon Stewart Northcott no demônio
que foi em vida. Não vou questionar o porquê de Clint Eastwood deixar os dois de fora do
filme, cuja história já é trágica demais.
Gordon Stewart Northcott foi encontrado na casa dos tios no Canada e levado a justiça. Vale
explicar que o trabalho do ator Jason Butler Harner foi um primor em reconstruir o assassino
de 21 anos na época.
Os julgamentos
Nos dias dos julgamentos, Christine Collins e o Reverendo Briegleb encontram milhares de
pessoas nas ruas questionando o que aconteceu. Questionando como a policia conseguiu ser
tão corrupta e como os crimes de Gordon Stewart Northcott levaram tanto tempo para serem
descobertos. A própria Christine foi defendida por um grande advogado que não lhe cobrou
nada para lhe trazer justiça.
Gordon Stewart Northcott que em seu julgamento, não teve a mínima vergonha na cara de se
considerar tão inocente quanto Christine Collins. Chegando a olhar nos olhos de Christine e dizer que nunca matou o seu filho. Foi condenado a pena de morte na forca para o dia 2 de Outubro de
1930.
O julgamento também determinou que o Capitão J.J. Jones e o Chefe James E. Davis
deixassem seus cargos. Os acontecimentos de Christine Collins definiram que as leis sobre
prisão sem mandato deveriam ser completamente mudadas.
Durante ambos os julgamentos, Christine Collins ficou completamente muda. O que enfatizou o
quanto que a atriz Angelina Jolie se esmerou em expressar tudo o que sentia sem dizer uma
única palavra. Atuação digna de Oscar e completamente dedicada a sua mãe, Marcheline
Bertrand, que faleceu em 2008.
A Morte de Gordon Stewart Northcott
Gordon Stewart Northcott foi um demônio em vida. Foi cruel com os mais fracos e covarde até
o fim de sua vida.
Poucos dias antes de sua execução, teve a cara de pau de enviar um telegrama para Christine
afirmando que falaria a verdade sobre seu filho se ela fosse ver ele. Lógico que Christina foi ao
encontro dele na cadeia. Culminando em duas sequencias especiais.
Temos uma cena especial só com Gordon Northcott e Christina em uma sala. Mas o assassino
se apavorou com a visita dela, ficou com medo do jeito que poucas vezes sentiu em sua vida.
Disse que foi fácil escrever um telegrama, mas falar na cara de Christina sobre como matou o
seu filho, era algo que Gordon não tinha coragem de fazer. É nessa hora que pela primeira vez
conseguimos ver Christine Collins usar a sua força física em todo o filme para colocar o
assassino contra a parede e tentar fazer ele confessar o que fez. Assim como vemos o
assassino apavorado tentando controlar a situação e perdendo completamente o controle.
Chega ao ponto onde ele é retirado da sala e Christine é deixada aos prantos no chão.
Por fim, temos a sequencia onde Gordon Northcott será enforcado.
E então podemos entender que todo o objetivo de Gordon era infantil. Ele dizia que depois de
se confessar, deus o perdoaria e ele não iria para o inferno. Mas só se ele não mentir. Mas a
cada passo da forca, ele enxergava o fim de tudo e que não havia como escapar do inferno. Por
não contar a verdade para Christine. Por não contar a verdade para uma mãe sobre o
assassinato brutal de seu filho.
O monstro revelava a sua verdadeira face. Gordon Northcott não passava de uma criança
apavorada que fez coisas terríveis. Passou a chorar, a implorar por perdão. De Modo que
quando o capuz negro foi colocado por cima de sua cabeça, tudo o que restou do monstro foi
um ser humano apavorado cantando “noite feliz”...
O filme mostrou que por debaixo do capuz do monstro havia um ser humano.
O pesadelo acabou depois de 3 longos anos.
Só um pouco de esperança
Em 27 de Fevereiro de 1935, sete anos depois
do pesadelo. Um menino foi encontrado, se
chamava David. O menino explicou para os
policiais então a sua história de terror. Ele foi
encontrado por Gordon Northcott e Sanford
Wesley, os dois pediram para David ajudar a
encontrar um cachorro na estrada.
Foi então que David foi levado para o velho
Galinheiro de Wineville, onde ficou preso junto
com outros meninos como ele. Sem mencionar
qualquer abuso ou assassinato presenciado, o
menino David explica que se lembra de Walter
Collins. Pois a noite, os meninos se juntaram
para abrir uma fenda na grade do galinheiro.
Porém, durante a fuga, David ficou preso na
grade.
Foi então que Gordon Northcott acordou e se
dirigiu para o galinheiro com uma espingarda.
Para se soltar da grade, David foi ajudado exatamente por Walter Collins. Os dois meninos então começaram a correr na escuridão enquanto o assassino atirava. E foi a última vez que David viu Walter Collins.
David passou anos escondido traumatizado e com medo.
E mesmo com o caso encerrado, isso deu um pouco de esperança para Christine Collins de que
talvez, talvez, Walter estivesse também escondido. E depois de tantos pesadelos, quem
negaria a esperança para uma mãe?
Clint Eastwood
Clint Eastwood conseguiu mais uma vez expressar perfeitamente a história de uma mulher
com todo o respeito que a história merece. Especialmente a história de Christine Collins, uma
heroína justamente delicada e a sua luta contra a corrupção e o horror absoluto!
A Troca é um filmaço muito bom, muito triste e muito assustador. Mostra Angelina Jolie no
melhor papel de sua vida.
Christine Collins é com certeza uma heroína que não deve nada ao feminismo. Especialmente
pelo feminismo idolatrar assassinos além do próprio assassinato de crianças.
Vale lembrar, Changeling é um termo do folclore europeu para quando a criança é trocada de
modo sobrenatural. Normalmente por fadas, duendes ou outros seres das florestas.
Comments